Os acidentes na infância são frequentes, fruto da imaturidade das crianças e da sua menor perceção do perigo. Importa reconhecer que as crianças têm particularidades que as tornam mais vulneráveis à lesão traumática acidental, e que as suas capacidades físicas e cognitivas, o grau de dependência, tipo de atividades e comportamentos de risco vão-se alterando ao longo do seu crescimento, para que a intervenção ao nível da prevenção possa ser eficaz (Dias et al., 2013).

A Organização Mundial de Saúde (OMS, 2008), define acidente como um acontecimento independente da vontade humana, desencadeado pela ação repentina, e afirma que os acidentes na infância, são uma causa importante de morte e incapacidade temporária e permanente em crianças e jovens, que associados aos elevados custos pessoais, familiares, sociais e económicos constituem um grave problema de saúde pública.

Os dados mais recentes da Our World in Data (2019) indicam que em 2017, 270 mil crianças morreram vítimas de acidentes ou lesões. De acordo com o relatório de avaliação da Associação para a Promoção da Segurança Infantil (APSI, 2017), em Portugal, entre 1992 e 2015, 6.273 crianças e jovens morreram na sequência de um traumatismo e lesão não intencional ou acidente, significando a perda de quase 360 mil anos potenciais de vida perdida, anos em que as crianças não puderam crescer, aprender e contribuir para a comunidade em geral.

Analisando os acidentes na infância quanto à sua tipologia, verifica-se que os acidentes de viação são a principal causa de morte das crianças na União Europeia, e a principal causa de traumatismos crânio-encefálicos e lesões na coluna, resultando em incapacidades permanentes (OMS,2008).

O afogamento é a segunda causa de morte não intencional entre as crianças da União Europeia, e a terceira entre crianças e jovens em todo o mundo. Estimativas globais sugerem que 2 a 3 milhões de crianças com idades entre 0-14 anos sobreviveram a um acidente por afogamento, em 2004, e que pelo menos 5% destas crianças apresentam sequelas neurológicas graves (OMS, 2008).

As quedas são responsáveis pela morte de cerca de 1500 crianças e jovens europeus entre os 0 e os 19 anos.  Não sendo a principal causa de morte nestas faixas etárias, é uma causa frequente de incapacidade, com um risco significativo de sequelas a longo prazo, e muito provavelmente o acidente com maior número de hospitalizações. Calcula-se que, por cada criança que morre na sequência de uma queda, 4 ficam com incapacidades permanentes e 37 são internadas (OMS, 2008). As quedas são a principal causa de lesões traumáticas cerebrais, com risco significativo de sequelas crónicas, especialmente entre os jovens, que enfrentam desafios significativos na sua recuperação, a nível fisiológico, psicológico e social (OMS, 2008; Weil & Karelina, 2019).

As queimaduras térmicas, são também uma das principais causas de morte e deformação das crianças na União Europeia, sendo que anualmente, 1700 crianças morrem vítimas de queimaduras, e as que sobrevivem sofrem incapacidades e deformidades permanentes (OMS, 2008). Os sobreviventes de queimaduras major necessitam de tratamento cirúrgico e reabilitação permanente até atingirem os 18 a 21 anos de idade. A necessidade de tratamento constante torna-se o foco das suas vidas. As crianças enfrentam ainda a dor intensa associada a este tipo de lesão, a ausência da escola, o possível desemprego no futuro, a rejeição social entre outros aspetos psicossociais (OMS, 2008).

As intoxicações agudas são também uma importante causa de acidentes na infância sendo a taxa de mortalidade mais elevada em crianças com menos de um ano, sendo os agentes causadores mais frequentes os medicamentos, os produtos de limpeza e os pesticidas (OMS, 2008).

Reconhecendo os acidentes como a principal causa de morte e invalidez entre crianças de todo o mundo, a prevenção de acidentes está intimamente ligada às questões da saúde infantil (OMS, 2008).  Neste sentido, o Enfermeiro Especialista em Saúde Infantil e Pediátrica tem um papel fundamental, podendo intervir a nível familiar e a nível comunitário, no entanto, toda a sociedade deverá ter um papel ativo reconhecendo o seu contributo para o sucesso da prevenção dos acidentes na infância.

Marta Vilaça

Estudante do curso de Pós-Licenciatura de Especialização em Enfermagem de Saúde Infantil e Pediátrica da Universidade do Minho

Patrícia Ferreira

Enfermeira Especialista em Enfermagem de Saúde Infantil e Pediátrica

ACES Cávado II – Gerês/Cabreira

 

 

Referências Bibliográficas

 Associação para a Promoção da Segurança Infantil. (2017).  Relatório de Avaliação. APSI. https://www.apsi.org.pt/images/25anos/PDF/APSI_RELATORIO_SEGURANCA_INFANTIL_2017.pdf

Dias, J., Costa, S., & Martins, S. (2013). Prevenção de acidentes em idade pediátrica: o que sabem os pais e o que fazem os médicos. Acta Pediátrica Portuguesa, 44(6), 277-282. https://doi.org/10.25754/pjp.2013.3490

Our World in Data. (2019). Child and Infant Mortality. https://ourworldindata.org/child-mortality#what-are-children-dying-from

Weil, Z. M., & Karelina, K. (2019). Lifelong consequences of brain injuries during development: From risk to resilience. Frontiers in Neuroendocrinology, 55. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC6905510/

World Health Organization, United Nations Children’s Fund. (2008). World report on child injury prevention. WHO. https://www.who.int/publications/i/item/9789241563574